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  • Foto do escritorRoque Rabechini Jr.

Gestão de Riscos: quando tudo parece invisível

Nunca ficou tão evidente a necessidade de adotar as práticas de gestão de riscos após os acidentes que ficaram conhecidos como Mariana e Brumadinho, ambos envolvendo exploração de minérios no Brasil. Quantas “barragens” já caíram em seu projeto? E o que dizer agora da pandemia provocada pelo COVID-19 que impactou o planeta? Os riscos foram gerenciados? A resposta a essas e outras questões poderá revelar a importância da gestão de risco para os executivos e gerentes, bem como para presidentes e autoridades mundiais. Ocorre que grande parte dos profissionais que decidem, o fazem de forma intuitiva, ignorando as potencialidades da gestão do risco.

Para iniciar o entendimento do que é uma sistemática de gestão de riscos é preciso, primeiro, compreender conceitualmente o que é risco e adotar um pensamento mais amplo, que dê fluidez aos mecanismos de gestão de uma organização. Não é possível mais dizer: “vamos deixar 10% para as contingências”. Isso é amadorismo gerencial. Os impactos provocados pelo furacão Katrina nos Estados Unidos em 2005 foram severos: US$2 bilhões com mais de 1800 mortes. O executivo ou o profissional que toma decisões precisa saber quanto vale o risco e quanto é preciso gastar preventivamente para minimizar seus efeitos ou arcar com as consequências.

Em alguns casos os números são grandes. Suponha que para segurar uma barragem, como aquela de Brumadinho, custe R$100 milhões. Você, como executivo, estaria disposto a tomar a decisão de investir todo esse montante para minimizar o risco? Mas qual o custo do estrago se a barragem cair? Seriam os R$2 bilhões anunciados inicialmente ou, depois, R$20 bilhões. Quanto?


Uma outra questão que inquieta os executivos e autoridades que decidem é: é possível prever os riscos? Para responder essa questão é preciso examinar como se dá a gestão de risco. É preciso saber que existem informações previsíveis e imprevisíveis e quem vai trabalhar com gestão de risco tem que saber buscar e interpretar tais informações. Tudo parece imprevisível, invisível, mas não é.


Veja, por exemplo, o caso do COVID-19, que mudou o cenário global em termos econômico, social e científico. Era sabido que havia o risco de uma pandemia. Vários sinais tinham sido dados por infectologistas e líderes mundiais. O que sabemos agora é que não estávamos preparados para tratar desse risco. Tudo o que foi feito foi muito improvisado! Globalmente! Alguns países que têm um arsenal de medidas preparadas contra possíveis ataques nucleares se revelaram frágeis para enfrentar um inimigo de proporções microscópicas, mas capazes de gerar impactos na saúde humana por meio de pandemias. Sabe-se, de um lado, que a Suíça tem inúmeros abrigos nucleares, mas, de outro, não evitou o risco da pandemia. Imaginem os países periféricos.


A pandemia do COVID-19 não é mais um risco e sim um evento (os vários eventos) que já ocorreu, portanto, um problema. Lavar as mãos e usar máscaras agora são medidas preventivas muito ingênuas e utilizadas após a ocorrência do risco. Pense no montante de dinheiro está sendo gasto, mas que poderia ter sido aplicado em medidas de prevenção ao risco. Só nos Estados Unidos, numa ação de liberação de dinheiro, foram disponibilizados algo em torno de US$ 1 trilhão para sua economia não entrar em colapso.


Então, quais os caminhos que poderíamos seguir para tratar das incertezas? Bem, há diferentes dimensões a serem tratadas, como ações de políticas públicas para uma nação, criação de modelos gerenciais para as empresas e também alternativas de ações individuais. Ações que devem ser integradas de tal forma que uma dimensão “fale com a outra”. É como acontece quando examinamos a gestão de riscos de uma empresa – não é possível somente a organização deter o conhecimento, é preciso que seus profissionais desenvolvam as boas práticas, que pensem mais em riscos.


Os 4 Pilares


São quatro pilares a serem considerados na criação de uma sistemática integrada para tratar de incertezas relativas às pandemias.

O primeiro pilar é a criação de centros integrados de gestão de riscos. Trata-se da constituição de grupos de especialistas com capacidades de gerenciar eventos incertos de alto impacto por meio de um modelo de gestão de risco para ser utilizado amplamente por toda sociedade e que leve em conta as várias dimensões – cidades, nações e mundo. São mecanismos, técnicas e ferramentas integradas dominadas pelas centrais de gestão de riscos capazes de avaliar, planejar, monitorar e controlar os eventos incertos. Os centros de gestão de risco têm e terão, entre outras atribuições, o papel de alertar a população em caso de eminência de uma crise que possa se espalhar mundialmente. Do ponto de vista organizacional, sabe-se que algumas empresas já adotam procedimentos semelhantes em caso de ocorrência de acidentes que impactem seus negócios. Sendo assim, pode-se dizer que é algo que já existe, mas precisa ser aprimorado.


Esses centros de gestão de riscos devem, portanto, armazenar, desenvolver e manter uma base de dados que possa ser integrada com informações de vários países buscando soluções eficazes, rápidas e inovadoras. Espera-se que um centro de gestão de risco possa ter sistemas de Big Data capazes de analisar informações de satélites sobre a evolução de uma pandemia, além de outras inúmeras capacidades, só possíveis com sistema dessa natureza. Somente um sistema de comunicação ativo, alinhado ao centro de gestão de risco, subsidiará as decisões efetivas.


Algumas informações relevantes, acredita-se, já estão em base de dados e servirão de consulta para o processo de tomada de decisão. Por exemplo, sabe-se que, mesmo sendo um vírus localizado, o Ebola se espalhou por três países africanos matando mais de 10 mil pessoas em um pouco mais de um ano. Sabe-se também, que o H1N1 originário da gripe espanhola, matou em menos de um ano, mais de 30 milhões de pessoas em 1918. Essas informações serviram, por exemplo, para tomar decisões de isolamento social, mas, sem dúvida, poderiam servir mais.


Concomitantemente à criação dos centros de gestão de riscos, é preciso investir pesadamente em pesquisa e desenvolvimento tecnológico na área da saúde para encurtar o tempo de criação de vacinas e produtos para realização de testes. Compara-se esse pilar com as capacidades técnicas das empresas de forma geral. Embora atualmente haja um bom conhecimento científico e tecnológico, há muitas barreiras que precisam ser transpostas. No caso do COVID-19, o infectologista e historiador, Prêmio Nobel de Medicina de 1996, Dr. Peter Doherty, afirmou que “é preciso algum tempo para saber se as vacinas ou remédios são seguros para os seres humanos”.


O terceiro pilar refere-se à criação de um forte sistema da saúde em países pobres para que haja possibilidades de prevenção contra a disseminação de vírus. Para Bill Gates, em palestra ministrada em 2014 no TED, é necessário um sistema de saúde com profissionais treinados com equipamentos adequados.

Por fim, o último pilar é um sistema de logística e comunicação capaz de absorver rapidamente as demandas e necessidades provocadas pela crise. Na pandemia do COVID-19 o Centro de Ciência e Engenharia de Sistemas da Universidade Johns Hopkins tem desempenhado muito bem a armazenagem e disseminação das informações.


As contribuições da disciplina de gestão de riscos são muitas e sua implementação pode servir a diferentes interesses. Com uma sistemática de gestão de risco será possível: 1) criar bases de dados de riscos; 2) organizar informações sobre incertezas; 3) associar responsabilidades nas diversas instâncias da gestão obedecendo a hierarquia organizacional; 4) disseminar a cultura de gestão de risco etc.


É evidente que os riscos de não implementar uma sistemática integrada de gestão de riscos são inúmeros, e, como estamos assistindo, seus impactos são imensos, impossíveis de serem relatados. É só abrir os jornais de hoje e checar as manchetes que certamente você vai encontrar um caso de negligência com a gestão de riscos.

 

Texto compartilhado pela Fundação Instituto de Administração (FIA), na newsletter do Programa de Gestão de Projetos, e pela ESAN Business School, em espanhol, disponível em duas partes: Parte 1 e Parte 2.

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